domingo, 29 de junho de 2014

Educação no campo demanda maiores investimentos, afirmam especialistas

No último dia 27 de março, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei nº 12.960, que altera o artigo 28 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB ao incluir parágrafo único que dificulta o fechamento das escolas rurais, indígenas e quilombolas.  No ano passado, quando a proposta foi apresentada, o então ministro da Educação, Aloizio Mercadante, destacou que mais de 13 mil escolas do campo foram fechadas nos últimos cinco anos, causando transtornos à população, que passou a demandar serviços de transporte escolar.
A partir da alteração na LDB, para o fechamento de escolas rurais, indígenas ou quilombolas, passa a ser necessária a manifestação do órgão normativo do respectivo sistema de ensino, como os conselhos municipais e estaduais de Educação. A manifestação deverá considerar a justificativa apresentada pela Secretaria de Educação, a análise do diagnóstico do impacto da ação e a manifestação da comunidade escolar.
No entanto, segundo especialistas na área, a lei não é suficiente para garantir que as escolas rurais, indígenas ou quilombolas permaneçam abertas ou que a educação no campo aconteça com qualidade. Para a avaliadora educacional do Ministério da Educação – MEC, Marialba da Glória Garcia Carneiro, que também é secretária municipal de educação do município de Pereira Barreto (SP) e dirigente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME, é preciso criar meios para que essa lei possa, de fato, ser cumprida. “Ainda que a intenção do governo federal, de tornar mais democrático o fechamento dessas escolas, seja boa, é preciso cercar a questão de cuidados, em especial com relação aos financiamentos”, diz.
De acordo com Carneiro, há inúmeras dificuldades com as quais os municípios têm de lidar no tocante à educação no campo, como contratação de professores e demais funcionários, manutenção desses profissionais na escola, infraestrutura, transporte escolar e o acesso a essas unidades de ensino. É necessária, segundo a especialista, estrutura apropriada para atender os alunos de forma adequada, o que implica na necessidade de mais recursos financeiros.
“Tem escola que fica a 150 km do município e, por conta disso, muitos alunos passam o dia inteiro viajando. Que qualidade é essa? Então, é obvio que seria de extrema relevância que essa escola permanecesse no campo. Mas para isso, além do professor, é preciso contratar funcionário de limpeza, merendeira, caseiro, e tudo isso também implica em financiamento. O aluno da escola rural é um aluno mais caro”, afirma.
O professor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto daUniversidade de São Paulo – USP, José Marcelino de Rezende Pinto, explica que o valor que os municípios têm atualmente para manter os alunos no campo está muito abaixo do custo real. “A maioria das escolas rurais é municipal e pequena, com menos de 50 alunos. Pela lógica do FUNDEB [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação], como o financiamento é per capta, o dinheiro nessas escolas não rende”, diz.
Segundo o professor, para fazer uma boa educação no campo, o gasto per captadeveria ser duas a três vezes maior em relação ao aluno da zona urbana, um valor maior do que o FUNDEB considera. “Ajudaria muito mais se o governo federal desse um incremento no valor do aluno”, afirma.
Rezende conta que para isso tem sido defendido o Custo Aluno Qualidade Inicial – CAQI, projeto lançado na Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que busca definir o padrão mínimo de qualidade para a escola determinado pela legislação brasileira. O CAQUI, segundo o professor, atende as escolas das zonas urbana e rural e já foi aprovado pelo Conselho Nacional de Educação – CNE, porém ainda não foi implementado.
“O CAQI seria um instrumento poderoso porque estabelece um valor mínimo a ser gasto por aluno do campo, e é um valor que se aproxima do custo real. E o projeto pressupõe que o governo federal coloque mais dinheiro no FUNDEB”, explica o professor. Ele considera, ainda, que está havendo um esforço grande dos municípios e da sociedade civil para incluir o projeto no Plano Nacional de Educação – PNE.
Já para Carneiro, a expectativa é que o governo federal ouça os representantes da sociedade civil e que, através do diálogo, possam construir juntos uma política pública que possibilite que o ensino rural seja igual ao urbano. “O que acontece no nosso país, ainda, e que é um grande problema, é a desigualdade social, não só no campo”, afirma.
Além disso, Rezende lembra que há outro grande desafio para a educação rural. A partir de 2016, será obrigatório o ensino para alunos de 4 a 17 anos. Entretanto, boa parte das escolas rurais, no Brasil, só atende até os anos iniciais, ou seja, crianças de 6 a 11 anos de idade. “É preciso pensar em um projeto de escola para o campo que englobe essa faixa dos 4 aos 17 anos. É fundamental não só manter abertas as unidades que já existem, como ampliar esse atendimento. Mas se não houver recurso, como vamos garantir a educação no campo?”, diz.
Luana Chrispim / Blog Educação

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